No dia 16 de outubro de 2019 foi lançamento da campanha de financiamento coletivo no Catarse, “Irui Kon’in: contos fantásticos do Japão”, que visa a publicação do livro Irui Kon’in no mukashi banashi – contos tradicionais japoneses sobre casamentos fantásticos pela Editora Urso, com tradução de Márcia Namekata e ilustrações originais de Lua Bueno Cyríaco.
Para que vocês leitores se inteirem sobre todo um universo diferente do ocidental, a editora Urso produziu uma série de posts que falam sobre os contos tradicionais, as lendas, a cultura e a mulher japonesa.
Neste post, a ilustradora do livro a ser financiado, o Irui Kon’in no mukashi banashi: contos tradicionais japoneses sobre casamentos fantásticos, fala um pouco sobre os personagens ilustrados e suas escolhas estéticas.
por Lua Bueno Cyríaco
A raposa é um animal muito popular dentro da cultura japonesa, é figura comum em contos fantásticos. A chamada kitsune tem poderes místicos que se acreditam relacionados a metamorfose, entre outros. É realmente muito difícil classificar de forma clara o que seriam, e como exatamente se manifestariam esses poderes místicos, visto que em algumas histórias ela pode ser vista como um espírito maligno que pode possuir corpos, em outras, apenas um ser que gosta de brincar com os humanos confundindo-os ao mudar sua forma e os levar ao engano.
Entretanto, de maneira geral a raposa é encarada com algum respeito. Possivelmente isso se deva ao fato da deusa Inari, do panteão xintoísta japonês, a ter como seu símbolo. Assim, de alguma forma ela empresta sua divindade ao animal, em especial à raposa branca -ou prateada-, que seria, dentro de uma classificação (se isso fosse possível de forma clara, embora não seja) um ser superior aos outros – no caso, às outras raposas. O status então da raposa branca, é comumente ligado ao divino, seria então uma raposa poderosa e de inclinações generosas, possivelmente até bondosas. Por isso é tão comum a representação da kitsune de alto escalão ser feita por uma majestosa raposa branca, conforme podemos ver em pinturas antigas e até mais recentemente em produtos da cultura pop, como livros, animes e games.
De qualquer forma, a kitsune é mesmo muito carismática e suas lendas são populares no Japão desde o século XI, tendo sobre ela histórias registradas no compêndio de narrativas Konjaku Monogatarishû (Antologia de contos do passado) publicada no Período Heian (794-1185). Esta em especifico se trata de um conto popular (mukashi banashi) chamado A Esposa Raposa (Kitsune Nyôbô).
É a história de uma mãe e seu filho, e das coisas incríveis que ele consegue com a ajuda de um pequeno junco mágico que sua mãe o presenteia. Embora ela não esteja presente fisicamente, sua proteção o alcança.
Se você sentir falta de mim
Venha e me procure
Na nascente da
Mata de Shinoda
(trecho de poema citado na novela “Kuzu” de Tanikazi, traduzido por Dirce Miyamura)
Nesta novela escrita por Jun’Ichiro Tanizaki, ele elucida ao leitor sobre uma curiosa ligação entre mãe e filho e a figura da raposa. Pois, esta exata narrativa da província de Kagawa em Shikoku, fala exatamente da mãe raposa que é separada de seu filho. Este trecho do poema se assemelha muito à tradução de Márcia Namekata:
“Como a raposa tinha mil e três anos, não poderia mais ficar ali; deixou então um bilhete onde se lia: ‘Se sentir muitas saudades, vá visitar-me na floresta de Shinoda’.”
A ilustração foi feita pensando em um trecho deste mukashi banashi, quando o menino Dôjimaru encontra sua mãe raposa na mata e recebe um presente. A escolha foi apresentar a mãe com o aspecto da figura humana mesclados à esposa animal, ou seja, os traços de uma raposa e como no conto diz, uma respeitável raposa branca.
O conto é possivelmente do período Chûsei (considerado a Idade Média japonesa, que vai do final do século XII até a metade do século XVI), sendo próximo à Era Heian (794-1185) e um período conturbado culturalmente onde a influência estética da chamada “Era Clássica japonesa” era muito forte, busquei apresentar a cosmética daquela época, nas roupas e penteados dos personagens. É interessante, pois ela difere um tanto da figura tradicional de trajes e penteados japoneses aos quais nós, ocidentais, somos mais familiarizados, que são na verdade típicos do Período Edo (século XVII até aproximadamente metade do XIX) em diante.
Este foi o resultado final:
A campanha está no ar até dia 15 de dezembro! Mas nesta primeira semana (que vai até ao meio dia de quarta feira 23) tem recompensa especial que fizemos para vocês!
Então, convidamos a conhecer o projeto aqui. Apoie! Só com o seu apoio esse projeto pode se tornar realidade!