Graças ao atual sucesso da série The Handmaid’s Tale produzida pela Hulu, as obras e a própria escritora canadense (autora de mais de 40 livros de poesia, ficção e ensaios) estão em um momento revival.
O aclamado Conto da Aia teve sua primeira tradução no Brasil em 1987, dois anos após seu lançamento internacional, pelo nome A História da Aia. Esta primeira edição foi produzida pela Editora Marco Zero, responsável também pela publicação de Vulgo, Grace e outros.
A autora é conhecida por sua posição ativista em relação não somente a causa feminina, mas humanitária e ambiental. Em 2016 recebeu o Pen Pinter Prize, concedido anualmente a autores que abordam temas de relevância para a sociedade. E ao conhecer a famosa distopia da autora, faz-se claro o motivo do prêmio.
Em O Conto da Aia, temos uma sociedade que vive em uma república teocrática, com um grave problema de natalidade e um total controle sobre o corpo e papel feminino. Trata-se de uma sociedade que, até os anos 80 era como conhecemos, e depois, dadas essas mudanças sociais e biológicas descamba para o cenário da distopia proposta.
É possível que muitos leitores considerem que a realidade apresentada por Atwood é fantasiosa, mas é interessante lembrar que, não muito tempo antes do lançamento do livro (1985) o Irã era uma sociedade onde as mulheres se vestiam e tinham as mesmas liberdades que as Ocidentais. Em 1979, quando se deu a Revolução Iraniana, o país deixou de ser uma monarquia e tornou-se uma república fundamentalista, baseando o controle da sociedade em escrituras religiosas, onde as mulheres deveriam andar cobertas dos pés à cabeça, usando preto.
O choque da personagem Offred (ou Defred, como na primeira tradução), uma independente universitária, não deve ter sido tão diferente ao de Marjane Satrapi, escritora e quadrinista iraniana (autora de Persépolis). Não é à toa que o livro tenha ganhado novo destaque, diante um cenário mundial tendencioso ao conservadorismo em várias vertentes.
Margaret Atwood aborda com precisão a questão do feminino, não como simples bandeira feminista, mas como denúncia da fragilidade que o papel feminino ainda tem mesmo hoje em dia, ou talvez, como uma forma de mostrar o quanto ainda há de se vencer certos conservadorismos que, no final das contas, prejudica a sociedade inteira. Até mesmo os opressores.
Essa visão crítica – que está longe de ser panfletarismo – é bem acentuada no livro Vulgo, Grace, que também virou série – produzida pela Netflix sob o nome Alias Grace –, traz uma narrativa não linear, apresentando a história de Grace Marks, uma mulher real que foi acusada de assassinato. A história é uma rememoração de Grace através de sessões com um psiquiatra, que é inicialmente o elemento neutro da história. Entretanto, a narrativa leva não só o personagem a se questionar, como também o leitor. Seria Grace uma dissimulada? Seria louca? Ou seria afinal das contas inocente?
Mas todas essas duvidas não são só levadas pela habilidade narrativa de Atwood, mas pela apresentação das imposições feitas à mulher, às pessoas de diferentes classes sociais e todas essas sutilezas das amarras sociais que fazem as pessoas recorrerem a ardis e insidias, e serem cada vez menos claras e passíveis de compreensão: O subterfúgio daquele que não tem o seu valor social reconhecido.
Aproveite a onda e presenteie nesse natal com um livro da Atwood! 😛
Artigos recomendados:
– Margaret Atwood: Será que eu sou uma má feminista? (artigo escrito pela própria autora)
– Um diálogo de Margaret Atwood com o feminismo
– Canadian ecocriticism and the Works of Margaret Atwood: State of Art and case study (Esse infelizmente só tem inglês. Mas é interessante, aborda o lado do trabalho dela que vai mais para o meio ambiente e ecocrítica )
It works quite well for me